“É uma medida
eleitoreira para trazer médico de fora sem fazer a revalidação do
diploma. Se eu topar, não vou me sentir como um agente transformador da
realidade da saúde pública do Brasil, ao contrário, estou legitimando
este absurdo”, disse uma das desistentes, Clarissa Oliveira, 27 anos.
Ela foi a única do grupo, todo de jovens, que topou se identificar.
Negou, assim como os demais desistentes, participar de um boicote ao
programa.
“Vi fotos do posto de Castelo Branco, que seria o
meu, e quero visitar só para ficar com a consciência limpa de que não
fiz pré-julgamento, mas ao que parece lá não tem estrutura nenhuma”,
disse.
Ela afirmou que irá hoje ao posto para bater o
martelo quanto à desistência. Confrontada com a garantia dada pela SMS
de que todas as unidades que receberão profissionais passam ou passarão
por reformas até o fim do ano, e possuem equipes completas, com
enfermeiros, técnicos e agentes de saúde, ela disparou: “E você acredita
nisso?”
Para
a SMS, a desistência desses cinco médicos, bem como dos outros 14 que
não apareceram, somente será oficializada quando não concluírem o
processo de contratação – cujo prazo final é sexta-feira. Três médicos
de outros estados, segundo a SMS, entraram em contato para informar que
tiveram problemas com o voo.
Os brasileiros devem começar a trabalhar amanhã,
depois de resolver os últimos trâmites burocráticos. A previsão é que
144 médicos assumam postos em toda a Bahia e 1.096 no país.
Estrangeiros
Dos 15 médicos de fora do
país que, segundo o Ministério da Saúde, optaram para trabalhar em
Salvador, apenas nove homologaram a inscrição. Desses, só cinco se
apresentaram ontem.
“Alguns tiveram que ficar mais tempo em seus países
para rescindir os vínculos que possuem lá, outros tiveram de resolver
como ficaria a locação da família. Então eles virão na segunda etapa do
Mais Médicos”, disse o secretário José Antônio Rodrigues. Os
estrangeiros ainda estão fazendo o curso de capacitação e devem assumir
seus postos somente no dia 16.
Dos 13 brasileiros que se apresentaram ontem e
manifestaram interesse em seguir no programa, quatro já trabalhavam para
a prefeitura, em contratos sem vínculo formal – e pagos diretamente
através de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado com o
Ministério Público.
Acuados
A presença da imprensa no
auditório da SMS, ontem, incomodou os 18 médicos presentes. Cinco
profissionais foram consultados pelo CORREIO para conceder entrevistas,
mas negaram.
“Esse assunto já gerou muita polêmica, tem muitos
colegas que vão encher o saco, melhor não, né?”, disse um deles. Quando
um fotógrafo começou a registrar a reunião, alguns taparam o rosto com
as mãos. Um reagiu: “Dá para parar de tirar fotos? Vão pôr onde, no
jornal é?”, indagou.
Apenas uma das participantes do programa se dispôs a
conversar. Maria da Conceição Souza de Abreu, 47 anos, passou 20
minutos criticando o Mais Médicos. “Quem está indo é por ideal. O Brasil
está realmente precisando de médicos nas áreas carentes e vou dar
minha contribuição”, disse.
Ela reclamou da importação de médicos sem a
submissão ao Revalida, do pagamento através de bolsa e da condição de
trabalho nos postos de saúde. “Vou ficar seis meses e avalio se
continuo. Não depende só de mim, mas de toda a infraestrutura que vou
ter ao redor de mim. Se puder fazer trabalho de boa qualidade, continuo,
senão saio”, disse.
Moradora de Salvador, ela pondera que a violência é
um fator que pode fazê-la desistir do programa, e minimizou o valor da
bolsa, de R$ 10 mil. “Dez mil é razoável? Divide para 20 horas semanais,
que é a carga de um médico, dá R$ 5 mil. Agora tire 13º, plano de
saúde, gratificações, férias, que eles não pagam, vai ficar quase nada. E
pagar um táxi de ida e volta para a periferia? Se botar na ponta do
lápis, vai ver que um técnico ganharia isso”.
O secretário comentou o clima de constrangimento
entre os brasileiros que aderiram ao Mais Médicos. “As vagas que eles
estão ocupando não estão tirando de nenhum médico daqui. Vamos tentar
tratar isso como uma continuidade de Provab”, disse.
O Provab (Programa de Valorização do Profissional da
Atenção Básica) foi lançado no início do ano como forma de estimular
recém-formados a trabalhar no SUS, com a compensação de dar pontos nas
provas de residência, e não gerou grande polêmica. “A diferença do Mais
Médicos é que permitiu a chegada de estrangeiros”, pontuou.
Reforma
Na palestra, a coordenadora de
Assistência à Atenção Básica, Luciana Peixoto, assegurou aos
participantes que todas as unidades que eles irão trabalhar estão com
equipe completa, faltando apenas médicos.
“Alguns de vocês vão chegar em unidades já
reformadas, outras em reformas, e vocês podem atender até em locais
improvisados, e alguns podem chegar em unidades feinhas, acabadinhas,
mais vão receber o cronograma das reformas. Até dezembro, todas estarão
em reforma ou reformadas”, alertou.
Luciana falou ainda da dificuldade de conseguir
atendimentos em especialidades como neurologia e angiologia. “Tem pessoa
com requisição há mais de um ano, mas não consegue atendimento”, disse.
Segundo ela, faltam médicos que trabalhem nessas especialidades que
aceitem receber pela tabela do SUS. A solução encontrada pela prefeitura
foi realizar mutirões anuais.
Prefeitura convoca mais 106 médicos de concursoA
prefeitura convocou ontem mais 106 médicos que fizeram o concurso de
2011, de diferentes especialidades. A Secretaria Municipal da Saúde
(SMS) convocou ainda 309 outros profissionais como enfermeiros,
terapeutas ocupacionais, dentistas e técnicos de enfermagem.
“Haverá outra convocação ainda de mais 31
profissionais na lista reserva do Programa Saúde da Família (PSF), e
vamos abrir outro processo seletivo para contratar médicos ano que vem.
Só no primeiro semestre serão 18 vagas em postos de PSF que estão sendo
construídos, e mais 45 para atenção básica. No total, precisaremos de
mais 100 médicos ano que vem”, disse o secretário José Antônio
Rodrigues.
Na semana passada, a prefeitura já havia convocado
235 profissionais. Para mais informações, o candidato pode procurar a
Subcoordenadoria de Provisão, Carreira e Remuneração no e-mail: pcre@salvador.ba.gov.br.